
Quem sou eu
- Denis Rodolfo
- Eu não sei na verdade quem eu sou, já tentei calcular o meu valor, mas sempre encontro sorriso e o meu paraiso é onde estou. Porque a gente é desse jeito ? criando conceito pra tudo que restou. Palhaço é um homem todo pintado de piadas,céu azul é o telhado do mundo inteiro, sonho é uma coisa que fica dentro do meu travesseiro. Mas eu não sei na verdade quem eu sou, perguntar da onde veio a vida, por onde entrei... deve haver uma saida e tudo fica sustentado... pela fé na verdade ninguém... sabe oque é. Perceber que a cada minuto tem um olho chorando de alegria e outro chorando de tristeza, tem louco pulando o muro, tem corpo pegando doença, tem gente namorando no escuro e tem gente sentindo ausência. Sei de muitas coisas. Mas não sei quem realmente sou.
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Triste ?
Vamos encarar a tristeza e outras coisas da vida como se fosse um obstáculo que todos temos no caminho da vida, e que esses obstáculos sejam métodos que todos temos para crescermos e evoluirmos.
Confie sempre em Deus e tudo vai da certo !
Leia até o fim
CARPEM DIEM!!!
Texto escrito por um brasileiro que vive na Europa:
"Já vai para 16 anos que estou aqui na Volvo, uma empresa sueca. Trabalhar com eles é uma convivência, no mínimo, interessante.
Qualquer projeto aqui demora 2 anos para se concretizar, mesmo que a idéia seja brilhante e simples. É regra.
Então, nos processos globais, nós (brasileiros, americanos, australianos,asiáticos) ficamos aflitos por resultados imediatos, uma ansiedade
generalizada. Porém, nosso senso de urgência não surte qualquer efeito neste prazo.
Os suecos discutem, discutem, fazem "n" reuniões, ponderações. E trabalham num esquema bem mais "slow down". O pior é constatar que, no final, acaba sempre dando certo no tempo deles com a maturidade da tecnologia e da necessidade: bem pouco se perde aqui.
E vejo assim:
1. O país é do tamanho de São Paulo;
2. O país tem 2 milhões de habitantes;
3. Sua maior cidade, Estocolmo, tem 500.000 habitantes (compare com Curitiba, que tem 2 milhões);
4. Empresas de capital sueco: Volvo, Scania, Ericsson, Electrolux, ABB, Nokia, Nobel Biocare... Nada mal, não?
5. Para ter uma idéia, a Volvo fabrica os motores propulsores para os foguetes da NASA.
Digo para os demais nestes nossos grupos globais: os suecos podem estar errados, mas são eles que pagam muitos dos nossos salários.
Entretanto, vale salientar que não conheço um povo, como povo mesmo, que tenha mais cultura coletiva do que eles.
Vou contar para vocês uma breve só para dar noção.
A primeira vez que fui para lá, em 90, um dos colegas suecos me pegava no hotel toda manhã. Era setembro, frio, nevasca.. Chegávamos cedo na Volvo e ele estacionava o carro bem longe da porta de entrada (são 2.000 funcionários de carro). No primeiro dia não disse nada, no segundo, no terceiro... Depois, com um pouco mais de intimidade, numa manhã, perguntei:
"Você tem lugar demarcado para estacionar aqui? Notei que chegamos cedo, o estacionamento vazio e você deixa o carro lá no final." Ele me respondeu simples assim: "É que chegamos cedo, então temos tempo de caminhar - quem chegar mais tarde já vai estar atrasado, melhor que fique mais perto da porta. Você não acha?"
Olha a minha cara! Ainda bem que tive esta na primeira. Deu para rever bastante os meus conceitos.
Há um grande movimento na Europa hoje, chamado Slow Food. A Slow Food International Association - cujo símbolo é um caracol, tem sua base na Itália (o site www.slowfood.com , é muito interessante. Veja-o!). O que o movimento Slow Food prega é que as pessoas devem comer e beber devagar, saboreando os alimentos, "curtindo" seu preparo, no convívio com a família, com amigos, sem pressa e com qualidade.
A idéia é a de se contrapor ao espírito do Fast Food e o que ele representa como estilo de vida em que o americano endeusou.
A surpresa, porém, é que esse movimento do Slow Food está servindo de base para um movimento mais amplo chamado Slow Europe como salientou a revista Business Week numa edição européia.
A base de tudo está no questionamento da "pressa" e da "loucura" gerada pela globalização, pelo apelo à "quantidade do ter" em contraposição à qualidade de vida ou à "qualidade do ser".
Segundo a Business Week, os trabalhadores franceses, embora trabalhem menos horas (35 horas por semana) são mais produtivos que seus colegas americanos ou ingleses.
E os alemães, que em muitas empresas instituíram uma semana de 28,8 horas de trabalho, viram sua produtividade crescer nada menos que 20%.
Essa chamada "slow atitude" está chamando a atenção até dos americanos, apologistas do "Fast" (rápido) e do "Do it now" (faça já).
Portanto, essa "atitude sem-pressa" não significa fazer menos, nem ter menor produtividade.
Significa, sim, fazer as coisas e trabalhar com mais "qualidade" e "produtividade" com maior perfeição, atenção aos detalhes e com menos "stress".
Significa retomar os valores da família, dos amigos, do tempo livre, do lazer, das pequenas comunidades, do "local", presente e concreto em
contraposição ao "global" - indefinido e anônimo. Significa a retomada dos valores essenciais do ser humano, dos pequenos prazeres do cotidiano, da simplicidade de viver e conviver e até da religião e da fé.
Significa um ambiente de trabalho menos coercitivo, mais alegre, mais "leve" e, portanto, mais produtivo onde seres humanos, felizes, fazem com prazer, o que sabem fazer de melhor.
Gostaria de que você pensasse um pouco sobre isso...
Será que os velhos ditados "Devagar se vai ao longe" ou ainda "A pressa é inimiga da perfeição" não merecem novamente nossa atenção nestes tempos de desenfreada loucura?
Será que nossas empresas não deveriam também pensar em programas sérios de "qualidade sem-pressa" até para aumentar a produtividade e qualidade de nossos produtos e serviços sem a necessária perda da "qualidade do ser"?
No filme "Perfume de Mulher", há uma cena inesquecível, em que um personagem cego, vivido por Al Pacino, tira uma moça para dançar e ela responde: "Não posso, porque meu noivo vai chegar em poucos minutos."
_"Mas em um momento se vive uma vida" - responde ele, conduzindo-a num passo de tango.
E esta pequena cena é o momento mais bonito do filme.
Algumas pessoas vivem correndo atrás do tempo, mas parece que só alcançam quando morrem enfartados, ou algo assim.. Para outros, o tempo demora a passar; ficam ansiosos com o futuro e se esquecem de viver o presente, que é o único tempo que existe.
Tempo todo mundo tem, por igual! Ninguém tem mais nem menos que 24 horas por dia. A diferença é o que cada um faz do seu tempo. Precisamos saber aproveitar cada momento, porque, como disse John Lennon:
"A vida é aquilo que acontece enquanto fazemos planos para o futuro"...
Parabéns por ter lido até o final!
Muitos não lerão esta mensagem até o final, porque não podem "perder" o seu tempo neste mundo globalizado. Pense e reflita, até que ponto vale a pena deixar de curtir sua família. De ficar com a pessoa amada, ir pescar no fim de semana ou outras coisas... Poderá ser tarde demais! Saber aprender para sobreviver... Repasse aos seus amigos, se tiver tempo.
Afinal...
Paz não é apenas a ausência de guerra entre os países.
Paz é garantir que todas as pessoas tenham
moradia, comida, roupa, educação, saúde, amor
compreensão, ou seja, boa qualidade de vida.
Paz é cuidar do ambiente em que vivemos,
garantir a boa qualidade de água, o saneamento
básico, a despoluição do ar, o bom aproveitamento
da terra.
Paz é buscar a serenidade dentro da gente para
viver com alegria os bons momentos, ter força e
boas idéias para enfrentar os problemas e
resolver as dificuldades. Isso tudo sem precisar
fugir.
Acima de tudo, PAZ é criar um clima de harmonia
e bem-estar na família e na comunidade,
lembrando-se sempre de que onde há amor, há
paz; onde há paz, há Deus; onde há Deus, nada
falta!
Nunca maltrate um animal
SE EU PUDESSE FALAR...
Não passe tão indiferente
só porque eu não sou gente,
só porque não sei falar.
Também sou um ser vivente,
sinto as dores que você sente
mas não posso me expressar.
Sou um bicho abandonado,
pela vida maltratado,
quase sempre escorraçado,
até mesmo apedrejado!
Vivo sedento e faminto,
ninguém quer saber o que sinto!
Se fico doente e triste
vejo logo um dedo em riste.
E vem a sentença fatal:
-Melhor matar este animal!
-Ele deve estar raivoso!
Para sua comodidade
vive dizendo inverdade,
fazendo muita maldade,
seu mentiroso.
Mesmo que esteja raivoso,
já foi descoberta a vacina.
Mas para a sua raiva humana,
ainda não existe remédio,
nenhuma medicação,
com toda sua evolução, na história da medicina!
Você mata o próprio irmão,
faz guerras assalta,
mata com ou sem razão,
às vezes por ambição!
É bem pior que eu,
que chamam de vira-lata!
Olhe bem pro meu semblante:
-Estou triste, apavorado,
pois, a qualquer instante,
posso ser sacrificado!
Mas você não se importa
nem com o seu semelhante!
-Você sim, está doente,
egoísta, indiferente.
Mas se algo ruim lhe acontece
logo lembra que há Deus,
chora, reza e faz prece...
mas Deus só ajuda aquele
que de todos se compadece.
Lembre-se do que escreveu
São Francisco de Assis:
-Quem maltrata um animal
jamais poderá ser feliz!
Paz mundial
festejaria cada amanhecer com uma linda canção.
Se o homem pensasse como o cavalo...
ultrapassaria os obstáculos com classe, firmeza e determinação.
Se o homem pensasse como o cão...
faria do amor uma constante troca de carinho, lealdade e fidelidade.
Se o homem pensasse como o gato...
teria calma e equilíbrio em qualquer dificuldade.
Se o homem pensasse como a abelha...
constataria que nada se constrói sozinho.
Se o homem pensasse como a formiga...
veria que trabalho e sucesso trilham o mesmo caminho.
Se o homem pensasse como a baleia...
veria a importância do poder da solidariedade.
Se o homem tivesse a pureza e a simplicidade de ser dos animais...
a paz mundial deixaria de ser um sonho e seria uma realidade...
Na vida eu aprendi ...
Aprendi que não importa o quanto você se dedique a alguém, algumas pessoas simplesmente não são capazes de reconhecer ou corresponder.
Aprendi que você pode até se sair bem com charme por uns quinze minutos, mas depois disso é melhor ter algum conteúdo.
Aprendi que custa um tempo enorme para nos tornarmos a pessoa que queremos ser.
Que é muito mais fácil reagir do que pensar.
Que ainda podemos continuar em frente muito além do que pensávamos que poderíamos.
Aprendi que ou você controla suas atitudes ou elas controlarão você.
Aprendi que independente da intensidade e do calor inicial de um relacionamento, a paixão passa e é melhor ter alguma coisa, além disso, para substituí-la.
Que existem pessoas que te amam de verdade, mas simplesmente não conseguem demonstrar esse amor.
Aprendi que meu melhor amigo e eu podemos fazer qualquer coisa, ou coisa nenhuma e ainda assim nos divertimos a valer.
Que às vezes quando estou irritada, eu tenho o direito de estar irritada, mas isso não me dá o direito de ser cruel.
Que a verdadeira amizade continua a crescer mesmo quando estamos longe. O mesmo acontece com o amor.
Aprendi que só porque alguém não te ama do jeito que você gostaria, não significa que ela não te ame de todo o seu coração.
Que você nunca deveria dizer a uma criança que seus sonhos são impossíveis ou improváveis de acontecer.
Poucas coisas são mais humilhantes que isso, e que desastre seria se esta criança acreditasse em você.
Aprendi que por mais que você esteja sofrendo o mundo não vai parar para você ficar se lamentando.
Aprendi que só porque duas pessoas discutem, isto não significa que não se amem, e às vezes só porque duas pessoas não discutem, também não significa que se amem.
Que existem muitas maneiras de se apaixonar e continuar apaixonado.
Que escrever, assim como falar podem aliviar as dores emocionais.
Estas coisas eu aprendi e muitas estou aprendendo a cada dia, e me dão mais razão, mais coragem, mais sentido e alegria em enfrentar esta sublime aventura que é a VIDA.
Mitos

Porca-dos-sete-leitões
"A porca-dos-sete-leitões... Essa gosta mais de vivê rodeano igreja na vila e as cruis da estrada, c'oa leitoada chorando de atrais.
— É má?...
— Cumo quê...
— Intê que não... — interrompeu a Cristina...
— Essa sombração é muito bão: só persegue os home casado que vem fora de hora pra casa..."
(Cornélio Pires. Conversas ao pé do fogo)
* * *
Aparece sempre à noite, atrás das igrejas, nas encruzilhadas, nos becos escuros, perto dos cruzeiros ou nas ruas desertas. A porca, roncando surdamente, é acompanhada de seus sete filhotinhos, que berram ao seu redor. Não faz mal a ninguém. Dizem que ela prefere assombrar os homens casados que voltam para casa fora de hora. Se o homem volta-se para encará-la, porca e leitões somem depois de alguns segundos, reaparecendo e sumindo novamente.
É mito de origem portuguesa e ocorre principalmente nas regiões centrais e meridionais do Brasil. Na versão recolhida por Karl von den Steinen, em Cuiabá, é a alma de uma mulher pecadora que interrompeu a gravidez. Tantos quantos forem os abortos, serão os leitões. Em algumas versões paulistas, é uma rainha que teve sete filhos e foram amaldiçoados por vingança de um feiticeiro. No imaginário português é o próprio diabo, ou coisa mandada por ele e, por vezes, também toma a forma de outros animais.
Segundo Luís da Câmara Cascudo (Dicionário do folclore brasileiro): "A porca, símbolo clássico dos baixos apetites carnais, sexualidade, gula, imundície, surge inopinadamente diante dos freqüentadores dos bailes noturnos e locais de prazer".
Artistas desconhecidos, porque só lembramos dos mais famosos ?
A pintura brasileira Ismael Nery




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Ao contrário de Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral e Vicente do Rego Monteiro, entre outros modernistas que voltaram-se para a louvação do nacional, do regionalismo, dos temas indígenas e afro-brasileiros, Ismael não se ateve a grupos e dedicou-se a expressar o universal, sempre através da figura humana, em retratos, auto-retratos e nus. Mas não deixou o espírito brasileiro de lado. Pode-se identificá-lo em inúmeros personagens do pintor por mais universais ou atemporais que sejam, como em quadros com personagens negros, trajados ao estilo dos malandros cariocas ou com roupas tipicamente brasileiras.
Em sua obra, relativamente pequena, com cerca de cem óleos e aproximadamente um milheiro de aquarelas, guaches e desenhos, pode-se distinguir três fases: a expressionista, que vai de 1922 a 1923; a cubista, de 1924 a 1927 e a surrealista, de 1927 ao fim da vida. As duas primeiras fases, consideradas as mais fecundas artisticamente, foram influenciadas por Picasso, enquanto que a terceira, fruto do contato com a obra de Chagall e outros surrealistas, elevou Nery ao status de precursor do surrealismo no Brasil. Além de ser pintor e desenhista, Nery buscou sempre novas técnicas, que aplicava com destreza em desenhos e ilustrações de livros. Atuou também como cenógrafo, e é correto afirmar que sempre esteve receptivo às correntes artísticas modernas mantendo, no entanto, características próprias.
Paraense, nascido a 9 de outubro de 1900, Ismael Nery muda-se para o Rio de Janeiro no ano da morte de seu pai, 1909. Ao completar 18 anos, começa a estudar na Escola Nacional de Belas Artes (Enba) onde, como tantos grandes talentos, era um aluno rebelde. Acaba deixando a Escola, mas mesmo assim, dois anos depois, em 1920, viaja para a Europa, especialmente França e Itália, e estuda na Academia Julien, de Paris, e na Escola de Arte. Lá, deslumbra-se com a história artística do Velho Mundo e com os mestres do passado, chegando a pensar, após ter contato com as obras de Ticiano e Tintoretto, por exemplo, que era inútil pintar.
Quando retorna ao Brasil, em meio à ebulição cultural de 1922, passa a pintar e desenhar com maior freqüência e intensidade. No mesmo ano, une-se à poetisa Adalgisa Ferreira, que seria reconhecida nacionalmente com seu nome, como Adalgisa Nery. Dessa união, que durou até a morte do pintor, nasceram dois filhos. Por outro lado, como sua pintura não atraía o público, Ismael tinha que ter uma forma de se sustentar. Se torna, então, funcionário público, começando a trabalhar como desenhista de arquitetura no Patrimônio Nacional do Ministério da Fazenda.
No Ministério, conhece o poeta Murilo Mendes, que se tornaria seu grande amigo e, mais tarde, nos anos 60, seria o responsável pelo ressurgimento de sua obra. Murilo integrou o pequeno círculo de amigos que conseguiu compreender a arte de Ismael. Por conta disso, foi um grande incentivador de sua obra, escrevendo artigos sobre o amigo, mas estes também surtiam pouco ou nenhum efeito. Nery era, ainda, inovador demais para a sociedade em que se encontrava.
Tendo reconhecido sua vocação, nunca deixou de cultivá-la, como todos os grandes artistas. Gênios como Mario de Andrade e Manuel bandeira, logo se deram conta de sua grandeza. O primeiro, inclusive, em um artigo de 1928, enuncia alguns pontos prováveis do desprezo do público por Nery, como o pouco refinamento técnico de suas pinturas, a rapidez com que ele trabalhava, parecendo que "os problemas se enunciavam nuns quadros, e são desenvolvidos noutros para terminar em ainda outros" e sua busca por "um tipo ideal representativo do ser humano".
E, apesar da rejeição, Nery não era, realmente, homem de um só talento. Além dos desenhos, pinturas e poemas, em 1926, idealizou uma filosofia própria, fundamentada no catolicismo e no neotomismo. O Essencialismo foi chamado assim por Murilo Mendes por ter como proposta principal a abstração do tempo e do espaço. No entanto, Ismael nunca chegou a escrever sobre ela.
Em 1927, retorna à Europa, desta vez com Adalgisa. Conhece André Breton, o principal teórico do surrealismo e entra em contato com a produção artística de Chagall e Miró. O surrealismo europeu, além do cubismo de Picasso e a metafísica de De Chirico são cruciais na construção de sua obra. Ao retornar, já munido de novas influências, realiza uma exposição em Belém, sua cidade natal, sem obter sucesso algum. No ano seguinte, no Palace Hotel, no Rio de Janeiro, mais uma exposição revela-se um fracasso.
Ao contrair tuberculose, com aproximadamente 30 anos, Nery se vê obrigado a deixar as tintas de lado e passa a dedicar-se a desenhos e poesias. Mais uma vez, a angústia do artista se exprime através de figuras mutiladas e poemas nos quais o autor se põe cara a cara com Deus. Segundo André Seffrin, sobre a parte final da obra de Nery, "Seu gênio transparece sobretudo nas aquarelas e nos desenhos que realizou nos poucos anos que antecederam sua morte. O Ismael Nery dilacerado, habitante inquieto de uma paisagem humana corrompida, é visível nesses trabalhos."
Quando morre, no Rio de Janeiro em 1934, aos 33 anos, deixa uma obra que seria mantida na semi-obscuridade até 1965, quando Murilo Mendes, quebrando a promessa feita ao amigo de não publicar suas obras, as inclui na VIII Bienal de São Paulo, mesmo sendo Nery praticamente desconhecido. A partir daí, seus quadros e seu nome começam a adquirir fama. Na X Bienal, já tendo peças e exposições disputados por colecionadores e galerias de arte, as obras de Ismael voltam a encantar expectadores na Sala de Arte Fantástica, Magia e Surrealismo.
Foram inúmeras as exposições feitas sobre o artista, que ganhou status de expoente da arte brasileira, desde que saiu do ostracismo. Além das Bienais de São Paulo, a Retrospectiva de Ismael Nery, em 1966, no Rio de Janeiro e a Retrospectiva Ismael Nery - 50 Anos Depois, em 1984, no MAC-USP foram de grande importância. Em junho de 2000, O Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) realizou uma retrospectiva comemorativa do centenário do artista, Ismael Nery: A Poética de um Mito.
Uma possível explicação para a grande estima que o público nutre pela obra de Nery atualmente, pode estar na postura extremamente humana que adotava tanto em sua arte como em sua vida. Ele voltou-se para o indivíduo e teve uma grande compreensão de sua solidão, sua alegria e de seus anseios. O trecho a seguir foi extraído do poema "Eu", feito pouco antes de sua morte. "Eu sou o profeta desconhecido, cego, surdo e mudo/Quase como todo o mundo".
A Árvore da vida dos amigos
Existem pessoas nas nossas vidas que nos fazem felizes pela simples casualidade de terem cruzado o nosso caminho.
Algumas percorrem o caminho a nosso lado, vendo muitas luas passar, mas outras apenas vemos entre um passo e outro.
A todas chamamos amigos e há muitas classes deles.
Talvez cada folha de uma árvore represente um dos nossos amigos.
O primeiro que nasce é o nossos amigo Pai e a nossa amiga Mãe, que nos mostram o que é a vida.
Depois, vêem os amigos Irmãos, com quem dividimos o nosso espaço para que possam florescer como nós.
Passamos a conhecer toda a família de folhas a quem respeitamos e desejamos o bem.
Mas, o destino apresentamos a outros amigos, os quais não sabíamos que iriam cruzar-se no nosso caminho. A muitos de eles chamamos-lhes amigos da alma, do coração. São sinceros, são verdadeiros. Sabem quando não estamos bem, sabem o que nos faz feliz.
E ás vezes um desses nossos amigos da alma estala no nosso coração e então chamamos-lhe um amigo namorado. Esse dá brilho aos nossos olhos, música aos nossos lábios, saltos aos nossos pés.
Mas também há aqueles amigos de passagem, talvez umas férias ou uns dias ou umas horas. Eles colocam-nos sorrisos no rosto durante o tempo que estamos com eles.
Falando do assunto, não podemos esquecer os amigos distantes, aqueles que estão na "ponta das ramas" e que quando o vento sopra, sempre aparecem entre uma folha e outra. O tempo passa, o Verão vai-se, o Outono aproxima-se e perdemos algumas das nossas folhas, algumas nascem noutro Verão e outras permanecem por muitas estações.
Mas o que nos deixa mais felizes, é que as folhas que caíram continuam junto, alimentando a nossa raiz com alegria. São recordações de momentos maravilhosos de quando se cruzaram no nosso caminho.
Desejo-te, folha da minha arvore, paz, amor, sorte e prosperidade.
Hoje e sempre...Simplesmente porque cada pessoa que passa na nossa vida é única. Sempre deixa um pouco de si e leva um pouco de nós.
Haverá os que levam muito, mas não haverá os que não nos deixam nada.
Esta é a maior responsabilidade da nossa vida e a prova evidente de que duas almas não se encontram por casualidade."
O papel da lua
Lua mãe dos desamparados,
amiga dos aflitos,irmã do sol,
doce e suave..
incomensurável em sua candura.
Entreguei-me em seus braços
E tu, resplandecente
transpassastes, meus desejos
mais secretos...
rompeste,a escuridão sombria e turva
que há séculos habitava meu ser.
Com braços esguios,enlaçaste
o meu espiríto..
que há muito rondava os oráculos
a procura de ti..
Tormento,tentação,
elucidação,devaneios..
Arrebatados em seus seios..
Loucura e perdição.
Teu desejo, não é o desjeo da lua!
Que atua,cultua,
ilumina, afaga
E fascinada roda a roda da vida
E toca nossa valsa..
Amamenta seus filhos, com um doce
mergulho em seus rios..
Caudalosos, reluzentes e luminosos.
Lambe-lhes a pele com língua de fogo
e transmuta todas as incertezas
Em verdades absolutas..
Leva nossos sentimentos as cavernas
calmas e seguras.
E retorna em nós..
Calma, clara, doce
e tranquila...
A lua.
Pilotou para viver e pilotou para morrer
Mal ele entrou, inspirou fundo e deixou seus pulmões serem invadidos por aquele cheiro característico de interior de avião, uma mistura de gasolina de avião com ar condicionado desligado. Não perguntem, é esse o cheiro mesmo.
Olhou em volta, as poltronas vazias. Lembrou-se da primeira vez que pilotara o velho 737-400 (ou 734, como é carinhosamente chamado pelos comandantes). Lembrou-se da trepidação das turbinas ao ligá-las, e o frio na barriga que sentiu então. Aquele avião inteiro sob seu comando. Todos confiavam nele. A vida de 120 pessoas em suas mão, dependendo totalmente de seu juizo.
Lentamente andou pelo corredor, por onde outrora passaram carrinhos com bebidas e comidas. Alguns anos mais tarde, passariam por ali também carrinhos com souvenirs, revistas e jornais. Se fechasse os olhos, poderia ouvir e ver passageiros passando por ali, indo ao banheiro, conversando com as famílias. Via as comissárias ("aeromoças", como diziam na época) sorrindo sempre, entregando toalhinhas refrescantes e fones de ouvido aos passageiros.
Chegou à cabine, onde observou demoradamente o painel, com todas as luzes e mostradores tão familiares. Vivera para aquilo a vida inteira.
Sentou-se na poltrona do piloto e fechou os olhos. Agora via o tráfego. Ouvia os controladores que davam instruções às aeronaves que chegavam ou partiam. Sentia a segura presença do co-piloto e engenheiro de navegação ao seu lado. Eles também confiavam nele cegamente.
Com as mãos firmes no manche, pôde sentir o controle absoluto daquele pássaro gigante de ferro e alma. Sim, porque não importa quão avançada é a tecnologia do homem, um objeto daquele tamanho e peso nunca sairia do chão se não possuísse uma alma para voar.
Uma mão pousou no seu ombro.
- Querido, temos que ir.
Era a sua esposa. Estava sorrindo, num misto de pena e tristeza. Sabia o que se passava no interior de seu marido. Ele olhou para ela.
- Me fala, Maria... quantos anos eu tenho?
- Você faz 70 hoje...
- Setenta... sabia que dentro deste avião eu passei 30 anos desses 70?
- Sim...
- Sabe Maria... eu achava que ia morrer voando. Nunca foi o meu medo. Foi a minha vontade. Já na escola de pilotos, todos diziam: "Bom mesmo é morrer voando"... Não é justo morrer em terra.
- Querido...
- Sabe.. acho que nunca ninguém pensou no "depois". Eu não pensava. Só sabia que estava destinado a voar. E nunca tinha parado pra pensar que um dia eu ia ter que parar. Simplesmente um dia eu não ia mais poder entrar num avião destes na qualidade de comandante. Pensava que aquilo ia durar para sempre.
- Não fala assim... nós temos filhos e netos que te adoram...
- Adoram, mas não deveriam. Esta profissão me consumiu. Eu raramente parava em casa, como você se lembra. Sempre daqui pra lá. De lá pra cá. Este é o último 734 operacional no mundo, você sabia?
- Não.. mas já foi sorte terem deixado a gente entrar aqui antes dos outros... daqui a pouco o piloto e os passageiros chegam e nós temos que ir nos sentar lá atrás, junto com os passageiros...
- É... ainda bem que eu conheço o pessoal neste aeroporto, não é verdade? Pude entrar aqui e ver tudo... matar saudades...
Ela sorriu.. não havia nada para dizer.
Ele se levantou e foram se sentar em suas poltronas, enquanto os passageiros entravam e ocupavam seus lugares. Os comissários de bordo iniciavam os serviços, auxiliando as pessoas a encontrarem suas poltronas, ajudando com as bagagens, tirando dúvidas.
Assim que as portas do avião se fecharam, ouviu-se a voz mecânica do comandante.
"Senhores passageiros, muito boa tarde, aqui quem vos fala é o comandante Soares. Gostaria de dar a todos as boas vindas ao vôo 1322 da nossa companhia aérea. Hoje é um vôo especial, pois é o último vôo deste Boeing 737-400 antes de ser substituído pelo novo Boeing 737-800. Temos também conosco neste vôo de despedida o Comandante Loureiro, que voou durante 30 anos somente no Boeing 734, como nós o chamamos. Hoje o Cmdte Loureiro completa setenta anos de idade e seria um grande prazer tê-lo durante o vôo na cabine de comando."
Dito isto, todos os passageiros olharam em volta, procurando o velhinho. Atônito, ele levantou-se e, sob uma enorme quantidade de aplausos, dirigiu-se à cabine.
O comandante recebeu-o com um largo sorriso e sentou-se no lugar do co-piloto.
- Comandante Loureiro, é com enorme prazer que o recebo em minha cabine e entrego em suas mãos o último vôo do nosso querido 734. Eu fico aqui de co-piloto, caso tenha se esquecido de alguma coisa.
Com os olhos marejados e sem articular palavra, ele olhava para o comandante e para o assento do piloto, temendo acordar a qualquer momento.
- Com todo o respeito, - conseguiu finalmente dizer - em momento algum da minha vida eu me esqueci de como isto se faz.
- Não duvido, Comandante Loureiro, não duvido. Sua fama como piloto é legendária, e se não fosse ela, jamais teríamos conseguido permissão da companhia para que o senhor pilotasse. Agora seria bom sentar-se, pois estamos atrasados.
Assim que se sentou, sua expressão modificou-se e os gestos tornaram-se precisos e mecânicos. O avião tornara-se parte do seu corpo. Todos os procedimentos faziam parte de um ritual sagrado que ele interiorizara tão bem quanto o ato de andar, mastigar ou piscar os olhos.
Pelo rádio, pediu autorização para taxiar até a pista. Na resposta, outra surpresa. Ele conhecia aquela voz.
- Antunes? - perguntou tímidamente.
A resposta veio precedida por uma risada.
- Então Loureiro, você acha que é o único velho sortudo que vai ter a oportunidade de se despedir dessa sucata? Em nome de todos os controladores (aposentados e ativos) dou-lhe os parabéns pelo aniversário e desejo um ótimo vôo para o já saudoso 734. Não poderia estar em melhores mãos.
Enxugando rapidamente uma lágrima que teimava rolar pelo canto do olho, ele disse:
- É bom saber que eu não sou o único gagá neste aeroporto. Agora me dá a autorização logo antes que eu fique em último na fila.
- Não se preocupe, parece que todos os comandantes neste aeroporto sabem do evento e se recusam a decolar enquanto não virem a última decolagem do "Loureiro e seu passarinho de estimação"
- Fazia tempo que eu não ouvia essa expressão... bom, então se temos platéia, que o show seja bonito. Taxiando ao ponto de espera da pista 09L...
É difícil descrever o que se passava em seu interior. Ele decolou ao som de palmas dos passageiros e da torre de controle, foi saudado com entusiasmo pelo pessoal do Controle e depois do Centro. Passou pelos 20.000 pés e, quando finalmente nivelou nos 33.000 pés, morreu.
Hoje em dia, quem visitar a sua lápide, pode ler.
"Pilotou para viver e pilotou para morrer"
Cabeça á cabeça
Então ela olhou para ele, sorriu suavemente, e disse “você não é meu dono”.
Ele ficou ali parado, tentando lidar com a devastadora verdade que aquela frase continha. Ele realmente não era dono dela.
- Mas nós… - tentou ele dizer
- Querido - continuou ela - nós somos um conceito. A sociedade é um conceito. Eu sou livre, eu sou mais eu, e eu não preciso de você, nem de ninguém
“…eu preciso de você” - ele pensou.
- Além do mais, olha para mim. Olha para o meu corpo. Olha para a minha vida, minha energia. Você realmente acha que daria conta?
“eu tentaria com todas as minhas forças” - pensou. Mas disse:
- Não. Eu acho que não.
- Pois é, meu caro! Eu gasto energia, eu preciso de energia para me alimentar. Esse negócio de ficar em casa deitada no sofá no seu colo é pra velho! E esse negócio de cozinhar pra você? Cê tá doido? Eu quero é sair. Eu preciso me divertir. Eu quero mais que você.
“você não é meu dono. Você não é meu dono” - a frase repetindo milhares de vezes em sua cabeça deixava-o louco.
- Não me leve a mal! O tempo que nós passamos foi ma-ra-vi-lho-so! Mas já deu. Já foi. Já era. Já num tô mais aqui, saca? Não consegue acompanhar, a gente não pode ficar ensebando mais ainda.
- Mas eu amo v….
- Nem fala isso, por favor! Não estraga! Estamos falando civilizadamente. Chantagem emocional aqui não.
“você não é meu dono você não é meu dono você não é meu dono”
- Que cara é essa?
- Você tem razão, minha cara. Eu não sou seu dono. Ninguém pertence a ninguém, e nós não seríamos a confirmação da regra, não é mesmo? - ele agora sorria assustadoramente.
- S-sim… mas…
- E o futuro a Deus pertence, é ou não é?
- Claro…
- Permita-me discordar.
- ?
- Permita-me refutar o que acabamos de concluir.
- Como assim?
- Vou citar um livro conhecido, chamado “O Pequeno Príncipe”, ou “O Principezinho”, dependendo do país onde você mora.
- Eu já li, mas o que tem a ver o…
- Lá, algures, há uma frase que fala sobre amizade e responsabilidade. Você se lembra?
- N-não..
- Lá diz que você se torna eternamente responsável por aqueles que você cativar. O conceito de responsabilidade, de certa forma, pressupõe alguma posse. Não em termos de ciumes ou autoridade, mas em termos de… responsabilidade. Respeito. Ajuda. Cumplicidade. Companheirismo. Intimidade.
- Claro.
- Então, seguindo nessa lógica, existe uma posse mútua entre duas pessoas que têm este tipo de elo. Tá acompanhando?
- Tô, mas…
- Então eu estou aqui à sua frente dizendo que você me cativou. Você tentou me cativar. Você conseguiu me cativar, e agora você é responsável por mim. Nós temos o elo. Nós temos o laço, e nós estamos unidos.
- Mas é que
- Eu tô pouco me lixando se você quer energia, se você tem energia a mais, ou se você é livre e vai mudar sua cidadania para os estados unidos! Você pertence a mim e eu pertenço a você. Talvez isso não te agrade, talvez agrade. Não importa.
- Você não está sendo coerente.
- Minha querida, eu vou colocar as coisas de forma simples. Você me tem e eu te tenho. Não sou homem de deixar as minhas coisas escaparem pelos meus dedos. Você não vai sair por essa porta sem antes me dar luta feia de argumentos. Eu tenho o amor do meu lado. Quem você chama pro seu time?
- Chega mais pra lá, quero deitar no seu colo e ver TV. Depois você vem comigo até a cozinha que eu quero te fazer aquela lasanha que você adora.
- E depois eu te levo pra dançar e depois a gente passa a noite brincando no quarto.
- Sou sua amor, você sabe né.
- Claro que sim.
História triste com final feliz
Foi numa ruazinha quase sem movimento, já muito próxima à minha casa. Primeiro, ouvi um miadinho. Miadinho de gato pequeno, filhote. Olhei e vi um bichinho listrado e minúsculo, muito magro e que tentava, com dificuldade, subir o pequeno degrau de um jardim. Arrastava uma das patinhas dianteiras, que no momento pensei estar machucada, por isso a dificuldade em transpor aquele pequeno obstáculo. Da janela, a dona da casa o enxotava aos berros.
Quis levá-lo comigo, cuidar dele, dar-lhe de comer. Mas pensei em seguida no meu gato adulto, é provável que ele não fosse gostar da idéia de outro habitante felino. Passei direto. Fui para casa com o coração na mão. A imagem do gatinho não me saía da cabeça. Começou a chover. “Ele não vai muito longe com a patinha daquele jeito, vai se molhar todo e vai morrer de frio... Talvez eu consiga arrumar alguém que possa ficar com ele... e se não arrumar?... Não posso, já tenho um...”
Esses pensamentos passaram por minha mente em pouquíssimo tempo. Por um lado, a memória invocava o sofrimento daquela pobre criaturinha; por outro, o receio de não ter o que fazer depois com o gato...
Peguei o guarda-chuva e voltei. Demorei um pouco para encontrá-lo sob umas tábuas de construção, em um monte de areia, já meio molhado da chuva. Era um bichinho assustadiço e muito pequeno. Estava todo esfolado e, alem da mão que não se mexia, tinha o rabo quebrado. Deve ter sido vítima de muita crueldade.
Trouxe-o para casa. Estava semi-morto de fome e sede. Ele provavelmente não sobreviveria até o dia seguinte.

Mas, se meu coração descansou por um lado (eu provavelmente nunca mais dormiria em paz se não o tivesse trazido), por outro foi o início de um período de extremo estresse mental para mim. Bem, aí está. O gatinho está seguro, seco, alimentado e hidratado. Mas, como eu temia, o Nanquim desencadeou um ódio mortal contra o pequenino, logo à primeira vista. Não suportava sua presença.
Muito angustiada, na mesma noite e durante aquela semana procurei, entre os conhecidos e também por via internet, alguém que pudesse e quisesse adotá-lo. Mas quando alguém se interessava, era só até saber que o gatinho era aleijado, pois, como vim a saber depois que o recolhi, ele não tem sensibilidade na pata dianteira, por isso a arrasta. É provável que tenha se machucado e danificado o tendão. A pata fica o tempo todo dobrada e ele se apóia nas costas da mão para andar. Apesar disso, brinca como qualquer gatinho jovem e está se tornando um gato lindo; depois que passou o medo inicial, se mostrou muito carinhoso e de bom caráter. Hoje ele está lindo, tem o pelo maravilhoso e uma alma muito boa!
Ainda bem que no fim tudo deu certo. Mas, durante aqueles dias, como sofri. O gatinho precisava ficar o tempo todo trancado na minha pequena lavanderia, para sua própria segurança. Acreditei que o Nanquim nunca o aceitaria, era o próprio Caim. Tinha muito ciúmes do pequenino e passou a ter mágoas de mim, era só o listradinho aparecer para o Nanquim me desprezar, não queria nem ficar perto.
Tenho muitos conhecidos veganos. Não comem carne nem consomem ou usam qualquer produto de origem animal. Dizem se preocupar com os animais e lutar pela sua libertação, proteção e bem estar. Bem, recorri a alguns deles para que me ajudassem a encontrar um lar para a pobre criaturinha que eu trouxe para casa. Claro, sei que a maioria das pessoas não tem condições de ficar com um bichinho desses, até porque normalmente quem gosta de gatos já tem a casa cheia deles. Mas pensei que se houvesse um apoio dessas pessoas, no sentido de divulgação do problema, acabaríamos encontrando alguém de alma boa e em condições de adotá-lo. E fiquei muito surpresa e decepcionada com a recepção de meus pedidos de ajuda, pois esses mesmas pessoas que erguem a bandeira e vestem o rótulo de preocupados com o bem estar e amantes dos animais, não foram capazes sequer de levar a sério meu problema! Nenhum deles, nenhum! Me olhavam com indiferença ou até com gozação. Fiquei muito decepcionada. Lembro-me de uma dessas pessoas que fez uma baita brincadeira de mau-gosto: “Pode me dar, meu pitt-bull vai adorar brincar com ele!” (??!!). Não achei graça. Meu problema era sério. E foi essa parte da história que me levou a reflexões sobre a natureza das pessoas. De como as pessoas têm uma necessidade de se enquadrar em um grupo social, uma ideologia para ditar regras, mesmo que não acreditem realmente de coração naquilo que dizem seguir. É mais fácil dizer “eu pertenço a tal grupo e sigo determinada ideologia”, do que raciocinar por conta própria formando um pensamento coerente e individual. Pensar é difícil, se conhecer é difícil, mais fácil é ter algumas regrinhas a seguir, mesmo que nunca se pense realmente sobre o assunto...
Engraçado é que as pessoas não-veganas com quem conversei, as que nunca se disseram amantes de animais, as que adoram um churrasquinho, foram as que se sensibilizaram mais e me deram maior apoio. Foram as que, depois de um tempo, mostraram preocupação e interesse em saber como estava o gatinho e o que havia sido feito dele. Os meus amigos veganos nunca mais tocaram no assunto, e sei que nem por um momento procuraram me ajudar (ou melhor, ajudar o bichinho) divulgando a história entre seus conhecidos. Confesso que fiquei magoada com isso.
Ao mesmo tempo, como curiosa que sou sobre o comportamento humano, achei interessante observar suas reações, e sempre que encontrava algum conhecido vegano, relatava a história, agora mais para ver como seria sua reação do que por esperança de obter ajuda. E as reações foram sempre de indiferença.
Mas deixarei essas ponderações, sobre comportamento e natureza humana, para o próximo texto. Quero antes terminar este, contando pra vocês o que por fim se sucedeu ao bichano, pois acredito que quem tenha chegado até aqui em meu relato, certamente esteja curioso em saber o fim da história. Eu disse que o final era feliz, e foi. Bem, pelo menos até agora, pois estando o gatinho ainda vivo, certamente não posso dizer que chegou ao fim...
Ele está comigo até hoje, cresceu e ficou lindo, é muito carinhoso e um dos gatos de alminha mais boa que já conheci. Quanto ao Nanquim, bem... depois de uns dois meses de muito estresse e sofrimento, acabou por se acostumar e até começou a ver nele um amigo para brincadeiras. Mas até hoje não posso sair e deixá-los juntos, só brincam sob as minhas vistas, pois o Nanquim às vezes apela e ainda tenta machucá-lo. Quando não estou em casa ele volta pra lavanderia, mas ainda assim acredito que seja melhor pra ele do que se houvesse ficado na rua, onde teria morrido vagarosamente e com muito sofrimento. No fim, achei bom que tenha ficado em minha casa, pois, além de ter adquirido grande amor por ele, sei que a maioria das pessoas não teria os cuidados e atenção necessários com a patinha aleijada, que requer, para sempre, cuidados especiais.
Espero ainda que um dia se acostumem completamente, e que o Nanquim aceite o Cisco (pois é assim que se chama o listradinho), de todo o coração, para que possam realmente se fazer companhia...